quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

PREPARAÇÃO PARA O MATRIMONIO

Dom Orani João Tempesta
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

Uma das preocupações mais sérias nestes últimos tempos tem sido a importância da família. Cursos, preparações, preocupações, orientações sempre estão presentes em nossas paróquias. Os vários movimentos familiares procuram recuperar a vida conjugal e a unidade familiar. Muitas pessoas não veem a importância que existe no processo matrimonial, que, quando bem administrado, pode ser importante catequese. Nem sempre se vê esses atos jurídicos como oportunidade catequética e fundamental encontro com a própria vocação.
No dia 22 de janeiro, o Santo Padre, o Papa Bento XVI, pronunciou o seu consuetudinário discurso aos membros do Tribunal da Rota Romana (Colégio dos Prelados Auditores, Advogados e outros colaboradores) que, segundo a Constituição Apostólica “Pastor Bonus”, em seu número 126, tem como tarefa:
“Este Tribunal ordinariamente funciona como instância superior no grau de apelo junto da Sé Apostólica, para tutelar os direitos na Igreja; provê a unidade da jurisprudência e, mediante as próprias sentenças,  constitui uma ajuda aos Tribunais inferiores”.
No discurso deste ano, o Papa Bento XVI recorda, no âmbito do matrimônio, a necessidade de que se busque reforçar a formação para uma adequada preparação para o matrimônio.
O Código atual, que reflete a eclesiologia do Concílio Ecumênico Vaticano II, demonstra uma preocupação muito grande em relação ao matrimônio, logicamente não limitado ao ato da celebração (momento da prestação do consentimento), mas também se volta para a sua concreta preparação.
A crise que permeava tantos que haviam buscado o matrimônio cristão foi, durante o Concílio, objeto de preocupação e consequente estudo e aprofundamento, manifestando-se depois na vontade dos Padres conciliares a reflexão contida na Constituição pastoral Gaudim et spes (47-52). Temos também a importante Exortação apostólica pós-sinodal Familiaris consortio, promulgada pelo venerável João Paulo II. É preciso, em tal preparação, que os pastores se preocupem em esclarecer os noivos para que o matrimônio seja celebrado válida e licitamente.
Não pode haver contraposição entre o direito e a pastoral, eles caminham juntos e não podem ser vistos como instâncias distintas.
Para o Matrimônio, sacramento onde os cônjuges constituem uma comunidade de vida e para toda a vida, é preciso que se repense, para aprofundar, a preparação para o mesmo, que deve ser remota, próxima e imediata, como deixa perceber claramente no cân. 1063: “Os pastores de almas têm a obrigação de cuidar que a própria comunidade eclesial preste assistência aos fiéis, para que o estado matrimonial se mantenha no espírito cristão e progrida na perfeição. Essa assistência deve prestar-se, sobretudo:
  1. pela pregação, pela catequese apropriada aos menores, aos jovens e adultos, mesmo com o uso dos meios de comunicação social, com que sejam os fiéis instruídos sobre o sentido do matrimônio e o papel dos cônjuges e pais cristãos;
  2. com a preparação pessoal para contrair matrimônio, pela qual os noivos se disponham para a santidade e deveres do seu novo estado;
  3. com a frutuosa celebração litúrgica do matrimônio, pela qual se manifeste claramente que os cônjuges simbolizam o mistério da unidade e do amor fecundado entre Cristo e a Igreja, e dele participam;
  4. com o auxílio prestado aos casados para que, guardando e defendendo fielmente a aliança conjugal, cheguem a levar na família uma vida cada vez mais santa e plena”.
Numa perspectiva jurídica, em concomitância com a índole sempre pastoral do Direito, é de relevância inegável o cuidado em evitar a celebração do matrimônio com riscos de declaração de nulidade (vícios de consentimento), mas também de invalidade (impedimentos). Recorda-nos em seu discurso o Papa: “Jurídico não quer dizer formalista, como se fosse uma mera prática burocrática, consistindo em preencher um formulário tendo como base perguntas rituais. Trata-se, isso sim, de uma ocasião pastoral única – a de valorizar com toda a seriedade e atenção que se exige – na qual, por meio de um diálogo cheio de respeito e cordialidade, o pastor procura ajudar a pessoa a situar-se seriamente perante a verdade sobre si mesma e sobre a sua própria vocação humana e cristã para o matrimônio”
A investigação prévia, feita de forma apropriada e responsável, tende a assegurar a ausência de impedimentos e a manifestação de um consentimento autêntico e livre. Muitíssimos males poderão ser evitados caso esse aspecto não seja descuidado pelos párocos, mas assumido com seriedade. Dessa maneira, sem sombra de dúvida, o aspecto jurídico põe-se a serviço da preocupação pastoral: tem como objeto, portanto, não apenas uma celebração lícita e válida, mas especialmente a estabilidade da própria vida conjugal, para isso se deve observar com diligência e fidelidade o que prescrevem os cânn. 1066-1070, como normas seguras e prévias à própria celebração.
No sentido específico do serviço prestado a toda a Igreja pelo Tribunal da Rota Romana neste aspecto: “provê à unidade da jurisprudência e, mediante as próprias sentenças,  constitui uma ajuda aos Tribunais inferiores”, recorda o Romano Pontífice que alguns capítulos de nulidade, mormente o 1095, 2º (grave falta de discrição de juízo) e 1101, § 2 (simulação parcial), de modo concreto naquele da exclusão do bonum coniugum. Afirma o Papa: “é necessário ter um sério compromisso para que as decisões jurídicas reflitam a verdade sobre o matrimônio, a mesma que deve iluminar o momento da admissão às núpcias”.
Embora o Bispo seja sempre o juiz nato em sua diocese, temos os nossos Vigários Judiciais que, por nosso mandato, desempenham, sobretudo no Tribunal Eclesiástico, esse ministério da justiça a esses colaboradores, que fiéis e em íntima sintonia com o Santo Padre e com o Bispo Diocesano, supõe fidelidade a jurisprudência da Rota Romana, exercício da justiça com equidade. É importante também estudar o relatório enviado a cada ano ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica e/ou também os dados finais fornecidos ao Centro de Estatística da Igreja. Nas sentenças de declaração de nulidade e nos processos de declaração de invalidade é preciso deixar evidente que “Não existe, portanto, um matrimônio da vida e outro de direito: só há um matrimônio, que é constitucionalmente vínculo jurídico  real entre um homem e uma mulher, um vínculo sob o qual apoia-se a autêntica dinâmica conjugal da vida e do amor”.
Que sejam os párocos e vigários a preencher o Processo de Habilitação Matrimonial, exercendo o múnus próprio de preparar com dignidade nossos noivos para um autêntico matrimônio católico. É uma importante ocasião para uma educação sobre a vida matrimonial e a beleza da vocação que os noivos estão assumindo.
A família, centro da vida cristã, deve ser valorizada como centro de nossa ação pastoral. Que a Sagrada Família abençoe as nossas famílias!

FONTE: Arquidiocese do Rio de Janeiro/RJ

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